Introdução
A esperança, muitas vezes, reside em um novo tratamento ou um medicamento inovador, capaz de mudar o rumo da história. Mas, essa esperança pode se transformar em desespero quando o tratamento, mesmo sendo recomendado por seu médico, não tem registro na ANVISA.
Você já recebeu a notícia de que o plano de saúde ou o SUS não irá fornecer o medicamento de que tanto precisa?
Mesmo que seu médico tenha comprovado a eficácia, a recusa ocorre porque o remédio não possui registro na ANVISA.
O registro da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) garante que todo medicamento comercializado no Brasil passou por rigorosos testes de segurança, qualidade e eficácia.
Existem caminhos legais para garantir o seu direito à saúde e à vida, mesmo quando se trata de medicamento sem registro ANVISA.
Quero saber mais sobre meus direitos
O que a Lei e a Justiça dizem?
A Constituição Federal de 1988 assegura, no artigo 196, que “a saúde é direito de todos e dever do Estado” e que o acesso a ações e serviços de saúde deve ser universal e igualitário.
Esse princípio constitucional não se limita a remédios registrados: ele alcança qualquer tratamento necessário para salvar vidas e preservar a dignidade humana.
A jurisprudência, ou seja, as decisões dos tribunais, tem se consolidado no sentido de que a recusa de cobertura de um medicamento de alto custo ou inovador, apenas pela falta de registro na ANVISA, é abusiva.
Em casos de urgência e para doenças graves, como câncer, esclerose múltipla ou enfermidades raras, a Justiça já entendeu que a negativa de cobertura fere o direito à saúde e à vida.
O STF ao julgar o Tema 500 (RE 657.718/MG) concluiu que, embora a regra geral seja não fornecer remédios não registrados, existe exceção em caso de mora da ANVISA e comprovados três requisitos cumulativos.[1]
O STF ao apreciar o Tema 1161 (RE 1.165.959/SP) discorreu que:
cabe ao Estado fornecer, em termos excepcionais, medicamento que, embora não possua registro na ANVISA, tem a sua importação autorizada pela agência de vigilância sanitária, desde que comprovada a incapacidade econômica do paciente, a imprescindibilidade clínica do tratamento, e a impossibilidade de substituição por outro similar constante das listas oficiais de dispensação de medicamentos e os protocolos de intervenção terapêutica do SUS.[2]
Portanto, esses julgados deixaram claro que a falta de registro não pode se sobrepor ao direito fundamental à saúde.
Os argumentos da negativa e como contestá-los
Sabemos que para conseguir o medicamento sem registro ANVISA, é fundamental entender os argumentos mais comuns usados pelos planos de saúde e pelo poder público para negar a cobertura e saber como contestá-los.
Argumentos comuns:
- “Medicamento sem registro na ANVISA”: Este é o principal argumento. Eles alegam que, sem o registro, não há como garantir a segurança e a eficácia do produto, e que o fornecimento é ilegal.
- “Não está no Rol da ANS”: Os planos de saúde costumam argumentar que são obrigados a cobrir apenas os procedimentos e medicamentos listados no Rol de Procedimentos e Eventos em Saúde da ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar).
- “Medicamento de uso experimental”: Eles podem alegar que o tratamento é experimental e que a lei não os obriga a custear esse tipo de terapia.
- “Tratamento off-label”: Usado quando o médico prescreve um medicamento para uma indicação diferente daquela aprovada no registro. Por exemplo, um remédio para câncer de pulmão usado para tratar câncer de mama.
Como contestar:
- Contra a falta de registro na ANVISA: A jurisprudência já pacificou o entendimento de que a falta de registro não é um argumento válido quando há uma prescrição médica e o medicamento é aprovado em outros países.
- Contra o Rol da ANS: O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já decidiu que o rol é uma lista de referência, não um limite. Se o médico prescreveu o tratamento como necessário e é um tratamento essencial, o plano de saúde deve cobrir.
- Contra o “experimental”: O tratamento só é considerado experimental se for parte de uma pesquisa clínica. Se o medicamento já é comercializado e aprovado em outros países, ele não é experimental.
- Contra o “off-label”: A prescrição é uma decisão do médico. Se ele justifica clinicamente a necessidade, o plano de saúde deve respeitar a autonomia e o conhecimento do profissional.
Fornecimento do medicamento Trabectedina
Em 2024, a 9ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça julgou procedente o pedido de fornecimento do medicamento Yondelis (Trabectedina 1,5 mg) para tratamento oncológico de um paciente diagnosticado com neoplasia maligna:
Foi novamente registrado na ANVISA em 12/08/2024, com validade de 36 meses (…) Dever de fornecer a medicação que conta com registro na ANVISA – Negativa de cobertura que apresenta contornos de abusividade, a teor das Súmulas 95 e 102 deste E. Tribunal de Justiça de São Paulo (…) Prazo de cinco dias razoável ao cumprimento da ordem judicial, considerada a situação do agravado, portador de câncer agressivo e metastático – (…)[3]
Fornecimento do medicamento Canabidiol
A 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais reconheceu que o Estado é obrigado a fornecer o canabidiol em face da existência de autorização para importação, mas sem registro na ANVISA.
TJ-MG – Agravo de Instrumento: 16487161820248130000, Relator.: Des.(a) Leopoldo Mameluque, Data de Julgamento: 01/10/2024, Câmaras Cíveis / 6ª CÂMARA CÍVEL, Data de Publicação: 09/10/2024
Fornecimento do medicamento Anafilaxia
A 10ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região reconheceu a obrigatoriedade de fornecimento da adrenalina na forma autoinjetável por risco de óbito.
Nesta decisão ficou reconhecido que o uso de anafilaxia é uma emergência médica, precisa ser rapidamente reconhecida e tratada e que há evidências científicas favoráveis ao uso.
E, que apesar de não ser comercializada no Brasil, por ausência na ANVISA, destacou-se que a adrenalina autoinjetável possui importação autorizada no país e que há uma falta de interesse dos laboratórios na comercialização por questões tributárias e burocráticas. [4]
Dúvidas sobre a obrigatoriedade do medicamento sem registro na Anvisa?
Diante da negativa de cobertura, a primeira impressão pode ser de desespero. No entanto, como detalhamos neste artigo, o direito à saúde e à vida são protegidos pela Constituição Federal e têm sido consistentemente garantidos pela Justiça.
Você agora entende os argumentos jurídicos que invalidam a alegação de falta de registro da ANVISA e que superam as limitações do Rol da ANS.
Além disso, a organização do seu caso é o seu primeiro passo para a vitória. A partir de agora, você já sabe como reunir a documentação médica e formalizar a recusa, conforme o passo a passo que descrevemos.
Para transformá-los em uma ação judicial eficaz, é essencial contar com o suporte de um advogado especialista em direito da saúde. Nosso escritório está preparado para analisar seu caso, organizar as provas e conduzir o processo com a agilidade necessária para que a burocracia não impeça o seu tratamento.
Não deixe que a negativa vire uma barreira para garantir seu tratamento médico.
Se você tem em mãos a prescrição médica e a recusa de cobertura, entre em contato conosco. Estamos aqui para te ajudar a lutar pelo seu direito e garantir a sua saúde e bem-estar.
Atendemos em São Paulo, Osasco ou por videoconferência, proporcionando o suporte necessário onde quer que você esteja. Para agendar uma consulta ou obter mais informações, entre em contato pelo telefone 11 2391-9440 ou preencha o formulário abaixo.
Fique tranquilo, as informações que você nos fornecer são confidenciais e protegidas pelo sigilo profissional, garantindo total privacidade.
Ian Varella
É o sócio fundador do escritório Varella Advocacia, especialista na matéria previdenciária e inscrito na OAB-SP com o número 374.459.
Com vasta experiência na área, ele possui especializações em Direito Previdenciário, Direito do Trabalho, Advocacia Empresarial Previdenciária e Previdência Privada e em Gestão jurídica.
[1] TJDF. Jurisprudência. Disponível em https://www.tjdft.jus.br/consultas/jurisprudencia/jurisprudencia-em-temas/precedentes-qualificados-na-visao-do-tjdft/direito-da-saude/saude-publica/tema-500-2013-fornecimento-de-medicamento-pelo-estado-2013-nao-registrado-na-anvisa. Acesso em 25/08/2025.
[2] STF. Jurisprudência. Disponível em https://portal.stf.jus.br/jurisprudenciaRepercussao/verAndamentoProcesso.asp?incidente=5559067&numeroProcesso=1165959&classeProcesso=RE&numeroTema=1161. Acesso em 25/08/2025.
[3] (TJ-SP – Agravo de Instrumento: 22497857320248260000 Embu das Artes, Relator.: Jane Franco Martins, Data de Julgamento: 23/08/2024, 9ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 23/08/2024)
[4] Jusbrasil. Jurisprudência. Disponível em https://www.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/trf-4/1697378015. Acesso em 25/08/2025.