Compreendendo a Análise Previdenciária – Para que serve a Carência?
A carência é um dos requisitos para que o segurado/dependente faça jus ao recebimento de um benefício previdenciário e ela indica a continuidade de contribuição previdenciária, seja por tempo de trabalho (obrigatório) ou por contribuições voluntárias (facultativo).
É importante ter clareza sobre o conceito de carência e como ele pode ser afetado pelas escolhas e eventos da vida laboral para garantir uma aposentadoria satisfatória ou para garantir o recebimento de um benefício em razão da incapacidade.
Muitos benefícios exigem o cumprimento de um determinado de meses pagos para ter acesso ao benefício e veremos como isso funciona na prática.
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O que é Carência?
A Carência é o tempo mínimo exigido de contribuição ao INSS para viabilizar o acesso a benefícios previdenciários.
Da mesma forma que ocorre na contratação de um plano de saúde, onde a carência é um prazo pré-estabelecido, em que alguns benefícios do plano de saúde não podem ser usados.
A carência pode ser configurada tanto pelo pagamento obrigatório que as empresas contratantes realizam mensalmente ao INSS referente ao trabalho oferecido pelo contratado ou pela contribuição voluntária do indivíduo que deseja ser segurado do sistema previdenciário, também realizada mensalmente e em dia.
Por isso, a carência é contabilizada em meses desde que o segurado realize o pagamento em dia das contribuições, conforme o artigo 24 da Lei 8.213/1991:
Art. 24. Período de carência é o número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas a partir do transcurso do primeiro dia dos meses de suas competências
Enquanto o tempo de contribuição está ligado com a comprovação do exercício profissional já a carência está relacionada com o pagamento em dia da contribuição previdenciária.
Então um contribuinte individual pode ter 38 anos trabalhados e o INSS reconhecer apenas 20 anos de carência, caso os 18 anos não foram recolhidos antes da primeira contribuição em dia.
Alguns dos benefícios previdenciários mais relevantes exigem um período de carência, como:
Benefício | Exige Carência? | Tempo de Carência |
Auxílio-doença | Sim | 12 meses |
Aposentadoria por invalidez | Sim | 12 meses |
Aposentadorias até EC 103/2019 | Sim | 180 meses |
Aposentadoria a partir da EC 103/2019 | Sim | 15 anos de contribuição |
Salário maternidade | Sim | 10 meses |
Auxílio-reclusão | Sim | 24 meses |
Portanto, cada um deles determina um tempo de carência específico para a concessão do benefício, portanto é necessário avaliar caso a caso quanto ao cumprimento do requisito de carência – além dos demais requisitos elencados na legislação previdenciária.
Mudança do conceito de carência – EC 103/19
Após a reforma de 2019, o conceito de carência deve uma pequena alteração e só será contabilizado o período em que a contribuição mensal esteja acima do limite mínimo mensal (salário mínimo):
Art. 26. Período de carência é o tempo correspondente ao número mínimo de contribuições mensais indispensáveis para que o beneficiário faça jus ao benefício, consideradas as competências cujo salário de contribuição seja igual ou superior ao seu limite mínimo mensal[1].
Caso seu salário esteja abaixo do salário-mínimo, saiba que é possível realizar a complementação, utilizar o excedente do salário que supere o salário mínimo ou agrupar os salários de contribuição:
1º Para fins do disposto no caput, ao segurado que, no somatório de remunerações auferidas no período de um mês, receber remuneração inferior ao limite mínimo mensal do salário de contribuição será assegurado:
I – complementar a contribuição das competências, de forma a alcançar o limite mínimo do salário de contribuição exigido;
II – utilizar o excedente do salário de contribuição superior ao limite mínimo de uma competência para completar o salário de contribuição de outra competência até atingir o limite mínimo; ou
III – agrupar os salários de contribuição inferiores ao limite mínimo de diferentes competências para aproveitamento em uma ou mais competências até que estas atinjam o limite mínimo[2].
Quanto a essa questão é recomendável buscar o auxílio de um advogado especialista na Previdência Social para apurar a melhor estratégia previdenciário, isto é, se vale a pena complementar, utilizar o excedente ou agrupar salários de contribuição.
Qualidade de Segurado
Ao analisarmos a carência dentro da análise previdenciária, é importante também falarmos sobre a Qualidade de Segurado e evidenciar a relação entre os dois fatores.
Qualidade de Segurado é o componente básico que garante que o indivíduo será contemplado pelo sistema previdenciário e seus benefícios, auxílios e seguros.
Uma das condições para garantir a manutenção da Qualidade do Segurado são as contribuições mensais ao INSS, seja através do pagamento facultativo (dona de casa, estudante e pessoas que não trabalham) ou através do pagamento obrigatório (empregado, autônomo e outros).
Ou seja, uma vez que o segurado não esteja recolhendo a contribuição social poderá, também, perder sua qualidade de segurado e dificultar o acesso ou o retorno ao sistema de previdência social, conforme o artigo 102 da Lei 8.213/1991.[3]
Um exemplo disso é a disposição legal, no artigo 102, referente aos benefícios previdenciários de aposentadoria e de pensão por morte:
§1º A perda da qualidade de segurado não prejudica o direito à aposentadoria para cuja concessão tenham sido preenchidos todos os requisitos, segundo a legislação em vigor à época em que estes requisitos foram atendidos.
§2º Não será concedida pensão por morte aos dependentes do segurado que falecer após a perda desta qualidade, nos termos do art. 15 desta Lei, salvo se preenchidos os requisitos para obtenção da aposentadoria na forma do parágrafo anterior.
Em regra, o benefício previdenciário será concedido quando o trabalhador tiver a qualidade de segurado e sempre será observado o direito adquirido, mas caso você tenha perdido a qualidade segurado ou não sabe se está no período de graça, leia o artigo que elaboramos sobre a Qualidade do Segurado, onde trazemos informações sobre a manutenção e a perda da qualidade segurado.
Isenção da Carência
Apesar de a carência ser um instrumento que garante a justa medida da concessão de benefícios previdenciários e o equilíbrio das contas públicas do regime geral da previdência social, há situações específicas que apresentam fatores urgentes, emergenciais ou extraordinários que exigem posicionamento adequado do Estado.
Imagina o caso de um eletricista que sofre uma descarga elétrica no segundo dia de trabalho e se aplicássemos a carência de 12 meses, o segurado ficaria sem receber o benefício por incapacidade em face de não possuir 12 meses pagos.
A isenção de carência visa proteger o segurado ou dependente que seja surpreendido com uma incapacidade decorrente de uma doença grave ou decorrente de um acidente.
Para isso, conforme orienta o artigo 26 da Lei 8.213/1991[4] e o Decreto 3.048/1999 há a possibilidade de Isenção da Carência, garantindo que a população seja amparada e acolhida mesmo que ainda não tenha cumprido com as contribuições como exigido em casos convencionais.
Vejamos quais são essas condições em que há isenção de carência:
- Pensão por morte;
- Salário-família;
- Auxílio-acidente;
- Auxílio-doença e aposentadoria por invalidez em caso de acidente de qualquer natureza, acidentária ou doença grave;
- Benefícios concedidos aos segurados especiais no valor de um salário-mínimo.
O segurado/depedente deve comprovar que na data do pedido cumpre ou requisito de incapacidade por doença grave ou falecimento do segurado ou a gravidez ou o acidente para fazer jus a isenção de carência.
Por exemplo, no caso do auxílio-doença por doença grave (câncer, cegueira, paralisia irreversível), o segurado deve comprovar que após contribuir para o INSS foi acometido pela doença em atenção a vedação legal do artigo 59 da Lei 8.213/1991:
§1º Não será devido o auxílio-doença ao segurado que se filiar ao Regime Geral de Previdência Social já portador da doença ou da lesão invocada como causa para o benefício, exceto quando a incapacidade sobrevier por motivo de progressão ou agravamento da doença ou da lesão[5].
A Jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça – STJ entende que o segurado não pode estar incapacitado antes de se filiar ao INSS, mas pode estar doente, vejamos um exemplo:
Não se nega a possibilidade em tese de que a superveniente incapacidade laboral decorrente de doença preexistente à filiação no Regime seja coberta pelo seguro social. O que não se permite é a cobertura social à incapacidade preexistente à filiação ao Regime. Portanto, a doença pode ser preexistente, não a incapacidade.[6]
Em uma decisão do STJ:
A idade avançada da autora somente corrobora que a doença incapacitante não é preexistente à filiação da recorrente, mas sim que a incapacidade por essa doença sobreveio em virtude do agravamento da hipertensão. Portanto, o acórdão recorrido não deu a adequada qualificação jurídica dos fatos, merecendo reforma. Não se trata, na espécie, de rever o contexto fático- probatório, vedado ante o teor da Súmula 7, mas sim de subsumir corretamente os fatos à norma..[7]
Em muitos casos, o INSS indefere a concessão ou a revisão do benefício previdenciário por divergências de entendimento legal sobre questões como doença grave, incapacidade x doença, data de início de filiação ao INSS e demais pontos.
Portanto, para as exceções é concedida a isenção de carência e o segurado e o dependente devem comprovar o cumprimento dos demais requisitos estabelecidos na legislação previdenciária.
Analisando a Carência nos benefícios previdenciários
O advogado, o INSS ou o Poder Judiciário devem analisar a trajetória profissional do trabalhador para verificar possíveis irregularidades ou questões que possam influenciar na concessão de um benefício mais vantajoso.
Nosso escritório sempre solicita os documentos trabalhistas como carteira profissional, PPP, extrato previdenciário e entre outros para que seja avaliado o requisito de carência – seja para verificar se cumpriu ou se há como pedir a isenção da carência.
Explicaremos, de forma resumida, como funciona a análise de carência e demais requisitos para concessão ou revisão do benefício previdenciário.
Benefício por incapacidade
No caso do benefício por incapacidade deve ser avaliado os seguintes pontos:
- Data de início das contribuições.
- Data de início da doença;
- Tipo de doença
- Data de início da incapacidade;
- Decorrente de acidente ou não
Além da análise da carência também são elaborados os cálculos previdenciários e as petições necessárias para a realização do requerimento administrativo e judicial.
Pensão por morte
Como não é exigido carência, no caso da pensão deve ser avaliado os seguintes pontos:
- Qualidade de segurado;
- Quantidade de contribuições – acima de 18 meses contribuídos o dependente recebe mais de 4 meses conforme o grau de parentesco.
- Comprovação da pessoa ser dependente do segurado (mãe, cônjuge, irmão, filho e outros).
Aposentadoria
No caso da aposentadoria deve ser avaliado os seguintes pontos:
- Data de início das contribuições;
- Se pode recolher contribuições em atraso;
- Tempo especial, rural ou serviço público;
- Se o autônomo ou facultativo recolheram a contribuição em dia.
Além da análise da carência também são elaborados os cálculos previdenciários e as petições necessárias para a realização do requerimento administrativo e judicial.
No planejamento previdenciário é possível analisar a carência, tempo de contribuição e valor da aposentadoria, além de questões que possam influenciar em um valor maior de aposentadoria.
No artigo Planejamento Previdenciário – Garantindo Direitos é exposto exemplos e demonstrado pontos interessantes e bastantes úteis para a compreensão completa do conceito de Carência. https://ianvarella.adv.br/planejamento-previdenciario/
Dúvidas sobre a Carência e demais requisitos
Se houver dúvidas sobre carência, qualidade de segurado, incapacidade ou tempo de contribuição, podemos te auxiliar na análise do seu caso e definição das melhores ações para garantir os seus direitos previdenciários.
O sistema previdenciário e seus seguros e benefícios são prerrogativa do trabalhador e deve-se garantir o acesso irrestrito do indivíduo a eles.
Entre em contato através do formulário abaixo para analisarmos as especificidades do seu caso e montarmos a melhor estratégia de análise previdenciária.
As informações encaminhadas estão protegidas pelo sigilo profissional, não sendo permitida qualquer divulgação.
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Ian Varella
É o sócio fundador do escritório Varella Advocacia, especialista na matéria previdenciária e inscrito na OAB-SP com o número 374.459.
Com vasta experiência na área, ele possui especializações em Direito Previdenciário, Direito do Trabalho, Advocacia Empresarial Previdenciária e Previdência Privada e em Gestão jurídica.